como escrever um livro: uma espécie de guia

De há três anos para cá, as perguntas que mais gostam de me fazer envolvem livros e como escrevê-los. Não sei quando é que as pessoas passaram a considerar-me uma expert no assunto, mas eu lá vou tentando responder a tudo com a sinceridade de alguém que, aos 21 anos, tem dois livros publicados, escreve livros desde os 12 mas não termina um livro desde o dia em que completou 19 anos. Mas pronto, o pessoal confia em mim e, de vez em quando, lá vêm as perguntas: como é que escrevo um livro? Por onde começo? E se eu não sei escrever?

Antes de mais, há que ter presente uma coisa muito importante: a metodologia de trabalho não tem de resultar para toda a gente. Sim, é isso mesmo: na escrita não há regras universais matemáticas. Há quem mantenha horários fixos de escrita, há quem destine apenas uma pequena parte do dia para escrever e até há quem ache (eu, por exemplo) que é impossível listar tudo o que um aspirante a escritor tem de fazer para escrever um livro. No entanto, há coisas que ajudam — muito! — a escrever mais e melhor.

Ler muito

Acho que é mais do que óbvio mas, ainda assim, há quem torça o nariz quando é dito que alguém que lê muito consegue escrever melhor. A verdade é que ler acaba por ser uma forma única de conseguir várias ferramentas necessárias para alguém que quer escrever (seja um livro ou seja outra coisa qualquer).

Considero especialmente importante ler sobre aquilo que mais escrevemos e ler livros ou outro tipo de textos com temas semelhantes àqueles sobre os quais queremos escrever. Por exemplo: se queres escrever um livro sobre ser vegetariano convém estudares o tema a fundo, leres artigos e teses sobre vegetarianismo e leres outros livros sobre o tema. Ainda precisas de mais motivos pelos quais ler é importante para escrever? Está bem… mas tu é que pediste!

  • Aumenta o vocabulário;
  • Aumenta o campo de imaginação;
  • Permite-te conhecer aquilo que é escrito na área em que vais escrever;
  • Faz-te levantar questões que podem vir a ser importantes para o que vais escrever — voltando ao exemplo do livro sobre ser vegetariano: se leste 5 livros e nenhum deles aborda algo que consideras importante, que tal começar exactamente por essa lacuna?
  • É bom e faz bem à alma.

Tens o talento, falta-te o trabalho

É o pão nosso de cada dia na blogosfera e fora dela: há tanta gente que até tem uma pontinha de talento (seja o que for o talento) para a escrita mas, depois, não se dá ao trabalho de praticar e melhorar a forma como escreve. A verdade é que, na escrita ou noutra área qualquer, o talento não chega. Na verdade, talento sem trabalho não chega. De que serve ter um talento natural para tocar guitarra se só se pega nela uma vez por mês? De que serve o talento para fazer serviços brutais no voleibol se só se joga nas aulas de Educação Física? E, claro, de que serve o talento para escrever se, depois, se escreve com erros e, claro, só se escreve de vez em quando? Acho que dá para perceber a ideia.

O importante de escrever é trabalhar a escrita: escrever todos os dias, escrever sobre mil e uma coisas, escrever coisas que vão acabar por, eventualmente, ser apagadas ou deitadas fora. E nisto de trabalhar a escrita há que incluir algo importante: saber escrever bem. O que nos leva a questionar o conceito de escrever bem.

O conceito de escrever bem

Dicionários, sites sobre gramática e ortografia, prontuários… ora aqui está uma lista de coisas importantes que as pessoas que escrevem deviam ler. É isso mesmo: há muito boa gente a quem não fazia mal ler um prontuário ou dois. Se há coisa em que a ESCS foi muiiiiiiiiito útil foi nesta ferramenta de aprender a escrever, de facto, bem. As aulas de TEP foram essenciais para eu poder mandar pessoas ler prontuários com a desculpa de que, de facto, não sabem escrever correctamente. E isto vai desde regências de verbos a frases estranhas como devia de ser ou ao cúmulo dos horrores de quem acha que o verbo ter é conjugado em tudo como o verbo ver (não perguntem… não consigo explicar o trauma).

Acredita que, quando te corrigem, deves aceitar a correcção e informar-te sobre o porquê de estares a dizer algo erradamente. Eu sei que custa um bocadinho quando nos corrigem porque parece sempre que as pessoas nos estão a rebaixar, mas, se o resultado nos torna melhores escritores, porque não? É por isso que, para mim, mais importante do que até escrever bem é escrever, de facto, bem e correctamente, sem erros, sem faltas graves, sem dizer bacoradas. Vá, vai lá dar uso ao Ciberdúvidas!

Por que motivo queres escrever?

Pronto, já percebeste que és um master da escrita, que escreves melhor do que muito licenciado e que já leste os melhores livros que havia para ler e, por isso, está na hora de pegares na caneta (ou de ligar o computador, vá) e começar a escrever. Uma das coisas que convém saberes antes de começares é o porquê de estares a escrever esse livro.

Talvez nem todos saibam mas escrever um livro pode ser uma verdadeira dor de cabeça, algo completamente desesperante. Tão desesperante que, a certo ponto, podemos questionar toda a nossa existência e intenções. Além disso, não escrevas (por favor!) porque achas que vais publicar facilmente e ficar rico e famoso. Não quero destruir sonhos mas escrever com esse intuito é capaz de não resultar lá muito bem. Primeiro escreve o livro e depois trata de tentar publicá-lo. Mas primeiro: escreve! Por isso, lembra-te daquilo que te motiva a escrever e começa, de facto, a escrever.

Sem desculpas!

Tenho doutoramento em procrastinação por isso sei bem do que estou a falar. Também sei o quanto assusta ter um mundo de páginas em branco para escrever e é por esse motivo que tenho a dizer que, para começar a escrever um livro, tens de deixar as desculpas de lado. Começa a escrever. Nem que seja a pior página da tua vida mas escreve! Se tens uma ideia base para a história, começa por a escrever e depois decides se queres escrever a partir daí ou se queres que essa ideia tenha antecedentes. Começa a escrever, sem desculpas!

A página à parte

Quando se trata de escrever ficção, gosto sempre de ter uma página à parte onde aponto o nome das personagens e algumas informações básicas para que não me falhe nada ao longo da narrativa. Esta página acompanha-me ao longo de todo o processo de escrita e vou acrescentando as personagens e as suas características à medida que as crio. Não sei se há mais quem use esta técnica mas é uma forma de ter uma espécie de guião.

Se fores escrever algo mais técnico, por exemplo, esta página de personagens pode facilmente transformar-se num índice onde apontas os temas e sub-temas que consideras importante abordar no teu livro, assim como os exemplos que deste em cada capítulo e que poderás mencionar noutros capítulos.

É como gravar um filme

Há uns dias disse a uma amiga que escrever um livro era como gravar um filme: as cenas não são gravadas pela ordem que vemos na montagem final e não é por isso que o resultado é pior. O mesmo deve ser tido em conta a escrever um livro. Se não consegues sair de uma cena não fiques preso aí! Escreve cenas aleatórias enquanto não consegues avançar nas cenas anteriores. No final até podes cortar mas, nos entre-meios, estás a escrever e, quem sabe, a ter ideias!

Dar a ler

Admito que nisto eu sou péssima. Cada vez menos gosto de mostrar trabalhos em progresso mas, de facto, pode ser uma boa ideia para não desmotivar e para ganhar ideias. Mostra aquilo que estás a escrever a alguém que seja sincero e que, além disso, te ajude e até levante questões que te possam ajudar a sair de uma encruzilhada ou a seguir um caminho no qual não tinhas pensado.

Se te sentires à vontade e gostares de escrever dessa forma, podes sempre tentar o Wattpad, mas, lá está, aquilo de ter os capítulos todos certinhos e não andar a saltar entre eles é algo que, como diria o outro, não me assiste.

Descobre que, afinal, não há uma fórmula secreta

Na verdade, estou aqui a escrever algo tão longo para chegar ao fim e dizer que não há uma fórmula mágica que te diga, passo a passo, como escrever um livro. Acho que o importante é mesmo escrever e ir escrevendo. Foi assim que escrevi os meus: fui escrevendo. Lia, editava, cortava, escrevia, re-escrevia. Quando ficava presa num capítulo passava para o seguinte.

No ano passado comecei a escrever um livro, que não terminei, e tinha os três primeiros e os dois últimos capítulos totalmente escritos. Só faltava o meio. Muitas vezes acontece assim. Sabemos o ponto de partida e o ponto de chegada, só temos de decidir como queremos chegar lá.

Mais uma vez: não sou expert no assunto, nem nada que se pareça! No entanto, se tiverem questões mais específicas, digam e eu tento responder da melhor forma que conseguir!

3 Replies to “como escrever um livro: uma espécie de guia”

  1. É tão isto o que partilhaste! Há muito que tenho o hábito de escrever, devido às fanfics que tenho por aí guardadas, cujas até já foram publicadas online (mas apaguei-as porque queria amadurecer neste âmbito), e depois de ler esta publicação, cheguei à conclusão de que talvez esteja no bom caminho, pois sou adepta de muitas dessas "técnicas".
    Já tenho livros inteiros escritos e a única coisa que me falta é reescrevê-los e modificar alguns pontos da história. Mas de resto, concordo contigo!

    Podes não ser uma expert, mas tens aqui um bom guia! 😀
    A Vida de Lyne

  2. Se há algo que sempre quis foi escrever um livro. Contudo, penso sempre que não sou capaz e vou adiando. Depois deste teu post acho que irei mudar 🙂
    Excelentes dicas 🙂

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