Costumo receber algumas perguntas sobre o mundo editorial e afins. Tento responder a todas com a maior sinceridade possível e sempre tendo em conta a minha experiência. Não é difícil saberem com que editora trabalhei nos meus dois primeiros livros, por isso é óbvio que toda a gente sabe que as críticas que faço ao mundo editorial são baseadas na experiência com essa editora e nas experiências de outros escritores que conheço e com quem já pude conversar.
A pensar nas perguntas que me fazem e nas coisas que me dizem, decidi juntar dez mitos do mundo editorial português, tendo em mente as experiências que conheço, mas, principalmente, a minha experiência, tanto de escritora como de leitora. Se quiserem deixar perguntas sobre o assunto ou se quiserem ver mais publicações do género, digam-me!
01 | Ganha-se (muito) dinheiro a publicar um livro.
Hmmm, como dizer isto? A não ser que escrevam logo um bestseller, que tenham uma máquina publicitária incrível e que tenham já (muitos) leitores fiéis, duvido de que façam muito dinheiro. Até podem nem fazer, se querem que seja sincera. Um autor recebe 10% do preço de venda do livro, o que é algo como 1€ por livro. No entanto, muitas editoras optam por apenas realizar esses pagamentos se o valor total chegar a um mínimo estipulado. Pelo que, muitas vezes, não recebem esse dinheiro porque venderam pouco. Além disso, em muitas editoras tem de se pagar para publicar. O preço que se paga equivale a um x número de livros que vão ficar automaticamente para vocês e que vocês podem vender à vontade, pelo que aquilo que ganham realmente virá daí.
02 | Todas as editoras fazem revisão das obras.
Nenhum dos meus livros foi revisto. E isso teria feito uma diferença tão grande no primeiro livro! É uma falha, claro, mas muitas editoras só querem publicar e não se importam com a qualidade do que publicam. O importante é chegar ao fim do mês e dizer que publicaram um grande número de obras. E não devia ser assim. Em ambos os livros que publiquei, a revisão foi feita por mim. Ora, eu escrevi o
Teremos Sempre Londres com 15 anos, editei-o e adaptei-o com 18. O que eu sabia de Português era tudo o que ia aprendendo nas aulas até ao 12.º ano e, claro, havia falhas. Só depois de entrar na ESCS e ter tido as maravilhosas e abençoadas aulas de Língua e Expressão do Português, soube que o ensino de Português em Portugal tem muitas falhas… graves. Quem lê o
Teremos Sempre Londres e quem lê o
Seja O Que For O Amor lê coisas completamente diferentes: em tema, em estrutura e em escrita. E talvez não fosse assim se alguém tivesse lido capítulo a capítulo e tivesse discutido cada capítulo comigo, de forma a corrigir gralhas e afins.
03 | É muito difícil publicar um livro em Portugal // Não é qualquer um que consegue publicar um livro.
Mas já viram quantas pessoas publicam livros neste país? Desde famosos a pseudo-famosos, qualquer dia não publicar livros será a excepção e não a regra. É mais fácil do que toda a gente pensa, sinceramente. Principalmente porque há muitas (e cada vez mais) editoras pequenas espalhadas por Portugal à procura de livros para publicar.
04 | A tradução de obras de outras línguas é brilhante.
Esta vem da minha experiência como leitora, claro. A tradução de muitas obras é pobre, deixa demasiado a desejar e, acima de tudo, consegue tornar um livro fraco. Quando li o
Born To Run, deparei-me com uma tradução que me deixou confusa num ponto: mencionavam alguém no masculino e eu tinha a certeza de que esse alguém era uma mulher. Fui pesquisar: é uma mulher. Mas a tradução foi mal feita. Noutros casos os diálogos perdem sentido e tornam-se mais infantis.
Case in Point: o
Miúda Online, da Zoella, de que vos vou falar em breve. Há palavras e expressões difíceis de traduzir para português, é verdade, mas há formas de o fazer e perturba os leitores quando não o fazem.
05 | Escrever um livro não dá assim tanto trabalho: é escrever e pronto.
Ai é só escrever? Ok, então escreve um livro. *inserir imagem de alguém a deitar a língua de fora antes de virar costas* ODEIO, ODEIO, ODEIO quando dizem que é algo que não dá trabalho. Estão a gozar comigo? Escrever dezenas de páginas com sentido, com ligação, com alguma coisa, não custa nada? Fogo, então não sei por que raio é que não escrevo um livro por mês,
geez.
06 | Se publicaste um livro então és escritor.
Pá, não. Não, não. Nem depois de publicar o segundo livro me senti escritora. Não é o acto de publicar livros que faz um escritor, mas sim a escrita em si, o trabalho e o tempo que se dedica a tal exercício, seja a escrever seja a aprender a fazê-lo. Ninguém é escritor por publicar um livro, não me venham com merdas tretas.
07 | Publicar um livro torna-nos automaticamente famosos.
Parece impossível mas há quem acredite que funciona assim. Não funciona. Mais uma vez, com (muitos) leitores fiéis, com uma boa máquina publicitária, talvez se consiga, mas não no mundo dos comuns mortais e, possivelmente, não serão mais do que famosos na vossa terrinha.
08 | Não é preciso ter grandes contactos para publicar e publicitar um livro.
Publicar é simples, publicitar nem por isso. Ainda hoje estou à espera de resposta aos e-mails que enviei a alguns locais e, acima de tudo, dos e-mails que era suposto a minha editora ter enviado. Meus caros, dá jeito conhecer pessoas. Não estou a falar de cunhas, estou a falar de conhecer pessoas que nos possam ajudar a publicitar o nosso trabalho e a mostrá-lo ao mundo. É preciso saber como fazê-lo e nem sempre uma pessoa sozinha o consegue fazer.
09 | Se está publicado, então é bom.
AHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAH Nem todos vamos gostar das mesmas coisas, claro, pelo que um livro ser bom ou não pode ser relativo. No entanto, não é o facto de estar publicado que determina a qualidade do livro. Não lemos já coisas horríveis e publicadas? Tal como já disse, há editoras que se preocupam mais com a quantidade de livros publicados do que com a qualidade dos livros que publicam, o que é uma triste realidade. Mas, lá está: nem tudo o que é publicado é bom, nem tudo o que é bom é publicado.
10 | O interesse de alguém pelo livro traduz-se em: essa pessoa vai comprar o livro.
Quem me dera! Se todas as pessoas que já me disseram tenho de comprar os teus livros tivessem, de facto, comprado os meus livros, garanto-vos que ambos tinham vendido mais uns cinquenta ou sessenta exemplares. E nem é por serem livros caros: 10€ e 12€ não é assim tão caro, comparado com outros livros, é só porque alguns acham que parece bem dizer que têm de comprar quando não querem comprar. Eu não fico mais feliz por dizerem que têm de comprar. Fico feliz quando dizem que compraram (e leram e gostaram).
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10%?! A sério…tenho uma amiga que também publica e a história é a mesma. E tendo em conta que quem escreve é a razão principal do livro existir, acho isso uma percentagem ridícula, a sério. Quanto ao resto, já sabia – mais ou menos – mas a questão da revisão faz mesmo comichão! Caramba, é óbvio que o próprio autor vai ter erros por simpatia que não vai apanhar, fazem negócio com tudo…olha, mulher, insiste, que qualquer dia andas aí com o nome na praça 😀
Jiji
10%, sim… e normalmente é 10% do preço sem IVA.
Foi das piores coisas com que tive de lidar porque é óbvio que quantas mais vezes lês algo que escreveste mais dificuldade tens em ler o que lá está escrito porque começas a saber coisas de cor.
Oh, obrigada!!!!<3
Uma das minhas resoluções para os próximos cinco anos é escrever um livro. Filha, já me estás a dar medo. :p
Não te assustes, mamã 🙂 Primeiro escreve, depois preocupa-te com estas coisas!
Adorei este post! Muito útil.
Beijinhos 🙂
http://dailyvlife.blogspot.com/
Fiquei chocada com a número 2, confesso! Mas isso explica o estado em que muitos livros são publicados…
Obrigada por, mais uma vez, desmistificares o mundo da escrita! (:
Beijinho*
Muita gente não tem noção disso!
Obrigada, querida Ju 🙂
Já tinha dado conta que a chiado editora não faz revisão, o que é uma pena. Gostei do post, não sei se já leste o "como publicar o seu livro "ou uma cena assim mas faz-lhe falta um capitulo deste tipo, porque o mundo editorial não são só rosas
Só lhes fica mal, o que é triste. Mas nem me vou alongar, porque tenho uma opinião demasiado forte sobre o assunto!
Não li, mas queria ler… só pela curiosidade de ver o que raio dirá o livro!
Adoro este tipo de visão atrás da realidade. E tu fazes sempre tão bem estas coisas. Com um toque de ironia e sarcasmo e genuinidade. Não fazia ideia de alguns destes mitos, porque sei como é um mercado difícil e como nada é imediato. Nem sei porque o tomam por garantido as pessoas. Só espero que o futuro te sorria mais neste campo e que, talvez, encontres uma editora mais dedicada!
Beijoca laroca. ?
Tive um professor de HCA que, no ano em que nos lecionou, publicou o seu primeiro livro. Quando ele me disse que ganhava, APENAS, 1€ por cada volume vendido, até fiquei besta!
E mais besta fico quando reparo que quase todos os livros que aqui tenho são bestsellers lá fora, o que me faz questionar: será que esses mesmos livros já estão há venda há bastante tempo e só agora é que foram reconhecidos; OU publicar e publicitar as coisas lá fora é seeeempre bem mais fácil? Enfim!
Gostei bastante desta publicação! Por mais disto!! 😛
A Vida de Lyne
O facto que mais me chocou foi mesmo as editoras não reverem os livros! Choca-me demasiado fazerem isso!
Wow! Vim aqui ter através da Tim e fiquei mesmo surpreendida 😮 curti imenso o "se está publicado é porque é bom, LOOOOOL" já agora quais são os teus livros?
Se calhar já os li :p
Beijinhos,
O meu reino da noite ~ facebook ~ bloglovin'
Uaaaau, a Tim a trazer gente aqui <3
Tenho dois: Seja O Que For O Amor e Teremos Sempre Londres 🙂
Olá!
Não me parece justo que compares todas as editoras à Chiado Editora. Quem lê muito e quem conhece minimamente o mundo editorial sabe que a Chiado é de fugir. Cheguei a ler uma reportagem (que agora não me recordo do nome, mas que certamente é possível encontrá-la na internet) em que foram entrevistados autores (que se sentiram enganados com a práticas desta editora) e dos próprios livreiros que confessam torcer o nariz a qualquer livro da Chiado.
Eu publiquei recentemente um conto numa Antologia da Editorial Divergência e posso-te dizer que é uma editora que acarinha os seus autores e paga direitos de autor.
Conheço um autor que começou por publicar na Chiado e mais tarde o seu livro foi aceite por outra editora e teve um tratamento bem mais profissional. Contudo, esse autor chegou a afirmar que publicar na Chiado lhe retirou alguma credibilidade.
Um conselho que te posso dar é que não voltes a pagar para publicar na Chiado. Certamente o teu trabalho merece mais respeito. Submete-o a outras editoras (p ex, tenta a Coolbooks, que aposta muito em novos autores portugueses), arranja leitores beta que te possam ajudar, procura um profissional que te faça uma revisão ao livro. Melhora o mais que puderes mas insiste. Não te contentes apenas com a Chiado porque dessa forma o teu trabalho nunca vai ser valorizado.
Eu confesso que, como leitora, fujo da Chiado. Já tive tantas más experiências, livros mal escritos, mal revistos, que considero uma perda de tempo investir neles. Claro que, algures lá pelo meio, há autores bons, que mereciam oportunidade, mas fica difícil encontrá-los.
Espero que não leves a mal o que aqui escrevi. Apenas não achei muito justo falares do mundo editorial em geral quando só tiveste experiência com a Chiado.
Se quiseres conversar, estarei aqui. 🙂
Beijinhos e força nessa escrita!
Não comparei editoras nem generalizei nada, por isso é injusto dizeres que o fiz. Simplesmente mencionei coisas que muita gente acha que acontecem e que nem sempre acontecem. Não acho que tenha dito alguma coisa errada em nenhum deles, até porque tive conta experiências de autores de outras editoras também.
Eu momento algum demonstrei vontade em voltar a pagar para publicar e/ou publicar na Chiado. Quem me acompanha há mais tempo e de perto sabe que não o planeio fazer porque se planeasse tinha voltado a publicar desde 2014 e não o fiz. Aliás, eu desencorajo toda a gente que diz que quer publicar lá!
Não levei a mal, só acho que interpretaste mal o propósito da publicação (até tive de a reler de tão "antiga" que já é para mim 🙂 ): não era comparar mas sim explicar que há realidades de publicação que as pessoas por vezes desconhecem.
Não interpretei mal, até achei bastante interessante o que escreveste e gosto de ler sobre experiências de outras pessoas.
Mas como no início disseste que todas as críticas que fazias ao mundo editorial se baseavam na tua experiência com a Chiado, senti que estavas a comparar.
Achei a publicação muito útil, nem que seja para desencorajar outras pessoas de publicar dessa forma.
Apenas não concordei muito com o tópico 3, acho que é difícil publicar em Portugal, principalmente para novos autores. Excetuando as vanities (em que basta pagar), as outras editoras são bem mais seletivas e não apostam em qualquer autor. É preciso ter alguma qualidade. 🙂