Tenho um lugar especial reservado a livros que mexem comigo. Aqueles livros que me deixam desconfortável num bom sentido, que me obrigam a pensar e que me mostram formas de ver o mundo diferentes da minha. Suspeitava de que isso aconteceria quando lesse o Comer, Orar, Amar, o que talvez tenha motivado o facto de ter escolhido lê-lo na altura certa. Tenho a certeza de que, se o tivesse lido quando soube da sua existência, há uns sete anos, a experiência não teria sido em nada proveitosa.
Comprei o livro no início do ano. Sabia que não o ia ler de imediato, mas também sabia que ia lê-lo em breve. Não peguei nele todos os dias, desde que comecei a lê-lo, mas fiz exactamente o tipo de leitura que queria fazer: sem pressas, com pausas para meditar sobre o que lia e com alguns momentos de conflito interior e com o livro. Não escolhi a palavra meditar ao acaso.
Para quem não conhece, o Comer, Orar, Amar (em inglês, Eat, Pray, Love) é um livro autobiográfico, de memórias. A autora, Elizabeth Gilbert, era casada, mas percebeu que aquele casamento a sufocava e precisava de se separar. Mas o divórcio foi complicado e desgastante. No final, Liz decidiu que queria passar um ano a viajar, a redescobrir-se. Parte então para Itália, depois para a Índia e por fim para a Indonésia, passando quatro meses em cada local. Em Itália, mais precisamente em Roma, descobre o prazer de comer e de aprender uma nova língua. Na Índia descobre Deus e encontra alguma paz num ashram. Na Indonésia, em Bali (where else?), encontra o amor e a felicidade que lhe parecia ter escapado com o final do casamento e da relação anterior.
Cada parte do livro corresponde a um país e em cada parte há 36 crónicas, algo que é explicado logo no início do livro, já que o número não é assim tão aleatório. As crónicas contam mais do que a experiência em cada local, dando algum enquadramento à história dos sítios por onde passa e também à sua própria história. A minha parte preferida foi — isso mesmo, adivinharam! — Itália! Talvez por ser, destes destinos, aquele que mais quero visitar. Não por não ter curiosidade em relação à Índia ou a Bali (se bem que, no 2 últimos anos, tenho visto demasiada gente ir a Bali e depois arranjar cães e dar-lhes esse nome…), mas porque já vos contei que quero muito conhecer Itália. No entanto, neste livro, a vida da Liz em Itália restringe-se a Roma, um dia em Nápoles e uma viagem a Veneza e outra a Sicília, por isso muito do meu entusiasmado ficou abalado… claro que depois ela falava das coisas que ia comendo e eu ficava só com fome, pronto.
A meditação e os momentos de conflito vieram quando a Liz chega à Índia. Ela vai para lá para viver num ashram. Inicialmente pensava ficar lá umas semanas e depois viajar pela Índia, mas acaba por ficar os quatro meses lá. Ora, eu sabia que a Liz queria encontrar, por assim dizer, Deus e a sua espiritualidade. E, por mim, tudo bem. Já meditei e fiz yoga, por isso conseguia identificar-me em algumas coisas, mas confesso que dei por mim a parar a leitura muitas vezes para pensar naquilo que acabara de ler, nas definições de Deus, na religião, naquilo que escolhemos adorar. Sinto que, aí, este livro conseguiu realmente incomodar-me, deixar-me desconfortável numa área que me faz levantar muitas questões: a religião.
Por fim, a Liz vai para Bali. Ora, como já disse, nos últimos dois anos, Bali tornou-se um bocadinho moda e vi muita gente ir lá. Tinha algum receio em relação a este capítulo por isso mesmo. Mas, curiosamente, como este livro se passa entre 2003 e 2004, foi interessante ter uma ideia diferente da ilha. Treze anos fizeram toda a diferença! Nesta parte, a Liz vai à procura de um curandeiro da ilha, o Ketut, que lhe ensina um novo tipo de meditação, entre outras coisas, e encontra amigos novos (a Wayan e a Tutti) e amor num brasileiro, o Felipe.
Este é um livro de uma jornada e sinto que a autora nos faz viajar com ela e nos ajuda a nos reencontrarmos um bocadinho, mesmo sem sairmos do sítio onde estamos. Também é possível que vos dê muita vontade de fazer o mesmo e largar tudo por um ano para viajar. Claro que não é uma possibilidade economicamente viável para o comum dos mortais (I wish!), mas, mesmo que não seja a mesma coisa, podem fazer o vosso próprio Eat, Pray, Love em casa, na vossa cidade. Afinal, o importante não é o lugar onde meditam ou onde rezam (se forem de rezar, claro): é a forma como o fazem. Da minha parte, talvez volte a meditar e talvez volte ao yoga. Ah! E não voltarei a ver o filme baseado neste livro: que adaptação péssima, minha gente! Vi-o ontem, depois de terminar o livro, para relembrar (acho que, quando vi pela primeira vez, não vi tudo), e foi uma desilusão do caraças. A única certeza é a de que ninguém começa e acaba este livro a sentir-se igual. Claro que tenho a certeza de que algumas coisas foram alteradas para o propósito do livro, mas a mensagem está lá e é isso que realmente importa.
Spoiler alert!
O livro termina com a Liz feliz com o Felipe, que visita meses mais tarde. Foi com alguma desilusão que, depois de ler, fui pesquisar e descobri que eles já não estão juntos! Confesso que fiquei desapontada, mas decidi avaliar o livro como algo que tem um início, meio e fim ali.
Eat, Pray, Love
Autor: Elizabeth Gilbert
Formato/Editora: Livro físico / Bertrand Editora
Ano: 2006 (edição portuguesa de 2009, reimpressa em 2016)
Mais livros aqui.
Vi o filme há cerca de dois anos e devo dizer que fiquei muito curiosa para ler o livro! Está sem dúvida na minha lista "de espera"! 🙂
Beijinhos
Andreia Capelo, ALL THE BRIGHT PLACES
Recordo-me de ir ver o filme ao cinema quando saiu em 2010. Ainda não li o livro e é claro que o livro é sempre diferente do filme, mas no entanto concordo contigo numa coisa – se o tivesse visto agora seria muito melhor do que o ter visto naquela altura.
Convenceste-me a dar uma nova oportunidade a esta história e ainda bem que já vi o filme em 2010 porque agora pouco me lembro dele e posso abraçar o livro à vontade 🙂
Beijinho!
It's Ok
Sem exageros, mas penso que esta foi das reviews mais completas e cativantes que eu já li e vi acerca deste livro! Deixaste-me mesmo com uma vontade de procurar por ele e lê-lo já! 😮 Enfim, aguardarei pelo momento certo para colocar isso em prática, eheheh.
Beijinhos,
LYNE