Tenho andado a ler as resoluções de ano novo de algumas bloggers e acho curioso o facto de haver tantas com o objectivo de começar a escrever um livro este ano. Acho muito bem, claro que sim, mas espero que se lembrem desse objectivo quando a motivação de início de ano passar. É que… vou contar-te um segredo: a parte mais difícil não é começar e também não é acabar. A parte mais difícil de escrever um livro é o que fica entre o começar e o acabar. Todas aquelas páginas que fazem o livro, toda a história, toda a pesquisa, todo o enredo do início até ao clímax e do clímax até ao final. Se o mais difícil fosse começar podes ter a certeza de que havia ainda mais livros no mundo.
Vamos lá conversar um bocadinho sobre isto
Muita gente acha que a parte complicada é ter uma ideia sobre a qual escrever. Garanto-te que não é. Boas, más ou péssimas, as ideias até costumam chegar facilmente. Claro que umas vêm tão rápido quanto partem.
A parte difícil também não é começar. Seja um início sólido ou um início mais fraco, quando temos uma ideia não é muito difícil começar a escrevê-la. E escrever fins também não é muito difícil. A certo ponto já sabemos como vai terminar e, mesmo que nos deixe um bocadinho reticentes e nostálgicos, não custa assim tanto.
Não, a parte mais difícil é mesmo a do meio. Eis o porquê:
Inevitavelmente, há uma altura, normalmente depois de passarmos a fase da introdução, em que começamos a perder o entusiasmo inicial. É normal. No início, que pode ser o primeiro capítulo ou um bocadinho mais, aquilo é tudo espectacular e está a correr tão bem e vai ser desta! Mas são só as primeiras páginas.
Depois a ideia deixa de ser novidade e perdemos algum do entusiasmo. Às vezes perdemo-lo por umas horas, outras vezes por uns dias, mas também há quem o perca para todo o sempre. Porque é ali que tudo se complica. Não é difícil meter a rapariga a conhecer o rapaz. O difícil é criar um enredo satisfatório e com sentido que faça com que eles se apaixonem, com que a acção atinja o seu ponto máximo e com que tudo se comece a desenvolver para que terminem juntos (se for esse o final que pretendes).
E isto é difícil porque exige mais de nós do que ter a ideia. Exige pesquisa, exige estofo, exige imaginação, trabalho, ritmo, rotina, força de vontade e não aceita preguiça. É por isso que muitos livros nunca se concretizam. Chega uma altura em que paramos e dizemos que depois voltamos lá e não voltamos. Ou quando voltamos já não faz sentido porque perdemos o ritmo. Se queres um conselho, quando alguém te disser que está a escrever um livro e que o vai terminar, pergunta quantas páginas já escreveu e em que parte da narrativa está. Se ainda estiver na introdução é melhor aguardares mais algum tempo antes de começares a adicionar esse livro à tua lista de leitura.*
Este não é um texto para te fazer desistir
Calma, está bem? Este não é um texto para te fazer desistir, mas sim para perceberes que para ultrapassar a parte mais difícil vais precisar de muita concentração e muita força de vontade.
Acredita: não é só ter a ideia e criá-la na nossa cabeça. Se conseguires passá-la toda para o papel então só tenho de te dar os parabéns e pedir que me digas onde posso comprar um exemplar! Conseguiste!
Mas se tiveres dificuldade em passar da parte inicial não desesperes… acontece a todos. Afinal, há aquela velha comparação de escrever um livro ser como casar: temos de ter a certeza de que estamos dispostos a acordar com aquele velha ideia dia após dia, semana após semana, até ao fim da nossa vida. E, tal como no casamento**, vai haver dias em que vamos querer o divórcio e nunca mais ver aquela ideia à frente. É nesses dias em que mostramos aquilo de que somos feitos e desistimos de uma vez ou lutamos e escrevemos o filho da mãe do livro, do princípio ao fim!
Por fim, a motivação tem de vir de ti próprio. Não há mais ninguém que possa motivar-te a escrever esse livro: é mesmo contigo. E acredita que, quando a coisa corre bem e não ficas preso na parte introdutória do livro que estás a escrever, a parte mais difícil é também a melhor e mais divertida: é a parte onde tudo acontece, onde podes matar personagens, onde podes criar discussões ou aventuras, onde o limite é o céu e toda a tua imaginação dá os melhores frutos.
É difícil, mas porra! É mesmo a parte que dá mais gozo escrever!
Gostaste desta reflexão?
* Um exclusivo: quase 100 páginas de word, cerca de 25% da narrativa completa.
** Na verdade, não percebo de casamentos, mas, para o propósito deste texto, vamos fingir que sim.
Sofia, adorei este texto! E é tão, tão, tão verdade! 😉 Beijinho
É mesmo isso!! tenho três "inícios" e sem fim… abandonados .
Entre a pagina 30 e a 50 parece que tudo deixa de fazer sentido. É que não sei mesmo como ultrapassar essa sensação…
Às vezes é preciso muita teimosa e persistência, mas se for para ir há-de ir! 🙂
Sabes, tenho como concordar porque eu tenho muitos livros terminados, apesar de muito imaturos em termos de escrita. Daí andar a reescrever o exemplar que te enviei. Sei como é que as coisas se vão passar pelo meio, o que é que é suposto acontecer, mas agora, o mais difícil está a ser ver como é que os acontecimentos se poderão intercalar. Mas é uma questão de trabalhar para isso! 😛
novo blogue: IMPERIUM