LIVRO VS. FILME: CALL ME BY YOUR NAME

call me by your name
Sei que cheguei um bocadinho atrasada à festa, mas só na semana passada li o Call Me By Your Name, do Andre Aciman, e, posteriormente, vi o filme. Aqui entre nós, só vi o filme no dia 1, mas queria tanto incluí-lo no Movie 36 de Março que decidi fazer batota. Por favor, não me processem! Queria que esta história fizesse parte do projecto precisamente porque o filme tem dado muito que falar e queria dar a minha opinião e ler também as vossas, já que acho que é um filme que dá para discutir vários assuntos.
Para quem não conhece ainda, Call me by your name passa-se no Verão de 1983 numa pequena vila do norte de Itália. Elio, de 17 anos, e a família recebem todos os anos um convidado em casa, que ajuda o pai de Elio com a correspondência e fica a viver com eles durante algumas semanas. Nesse Verão o convidado é Oliver, um escritor, filósofo e professor americano de 24 anos. Elio acaba por se apaixonar por Oliver, mas inicialmente não compreende se é correspondido ou não e se aquilo é um sentimento real ou se é apenas carnal.

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O LIVRO
A forma como o livro está escrito deixou-me impressionada. É um livro mais descritivo e todos os diálogos têm um propósito próprio, por isso há pouco diálogo e mais descrição. Quando digo que é muito descritivo também quero dizer que todas as partes mais sensuais são realmente descritivas. Excepto duas cenas muito específicas (uma delas nem entrou no filme e ainda bem!), não houve uma única cena que me tenha feito sentir incomodada. O final do livro (que é um bocadinho diferente do final do filme) deixou-me um bocadinho triste, mas não vou dar-vos spoilers!
O FILME
Achei que a maior parte do filme está realmente bem adaptada em relação ao livro. Mas o melhor foi poder ver as imagens de Itália. No livro já há muitas descrições italianas que me fizeram sonhar, mas no filme acho que suspirei sempre que havia paisagens de Itália (e também sempre que podia admirar a forma física do Armie)! Da adaptação só tenho pena que em vez de Roma tenham escolhido Bérgamo para uma das cenas finais, não por Bérgamo não ser maravilhosa, mas porque a cena lá acaba por parecer um bocadinho vinda do nada. No livro, toda a cena de andarem lá pelas ruas a cantar bêbedos vem de algo antes e não parece que caiu do céu. Também acho que a mítica cena do pêssego não se compreende tão bem no filme, principalmente a reacção do Elio.
E AS CRÍTICAS?
Li algumas opiniões que me fizeram confusão. A primeira foi a de acharem que um rapaz de 17 e outro de 24 anos não se podiam envolver porque era claramente pedofilia ou algo do género. Bem, só posso ficar feliz por não ter um livro famoso porque o meu primeiro livro de ficção era uma rapariga de 17 e um rapaz de 26… pois!
Também achei exagerado compararem esta história ao 50 Shades. Não têm nada a ver. O Call me by your name, tanto no filme como no livro, é uma história muito mais realista, bonita e, sinceramente, muito melhor a nível de escrita. Nada de diálogos fracos e descrições básicas. Além disso, como é que querem comparar uma história em que um gajo é rico e quer uma submissa e se apaixonam mas ela na verdade não o conhece assim tão bem e quer que ele seja uma pessoa que não é a uma história em que um rapaz se apaixona por outro com tudo aquilo a que o amor tem (ou deve ter) direito.
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O QUE ACHEI?
Confesso que, no final do livro, dei por mim a perceber que nunca tinha pensado em algumas coisas que li sobre os possíveis sentimentos de um rapaz quando percebe que gosta de outro rapaz e, posteriormente, depois de se envolver sexualmente com outro rapaz. Além disso, também percebi que não vi necessidade nenhuma de descrever o filme como um filme homossexual (porque não o é) nem bissexual (está mais aqui). É um romance que, por acaso, é entre dois rapazes. Conheço alguns romances reais entre dois rapazes e não é por isso que tenho necessidade de estar constantemente a rotulá-los por isso também não vi essa necessidade no filme e no livro.
Mas aquilo em que mais pensei no final do filme foi algo em que gostava de vos fazer pensar também. Há uma certa tendência para incentivar e quase exigir que uma pessoa LBGTQ tenha de se identificar como tal. Enquanto lia o livro dei por mim a pensar se também esperam que eu chegue ao pé de alguém e tenha de me assumir heterossexual. Porque é um double standard: se somos heterossexuais não temos de dizer que o somos, mas se não formos já é todo um filme e já é preciso sair do armário e mais uma série de expressões bem foleiras. Já viram o que era eu ter de chegar um dia ao pé dos meus amigos e dizer: olá, pessoal, olhem tenho de vos dizer isto… já devia ter dito antes, mas não deu. Bem, cá vai! Eu sou heterossexual! Isto não cabe na cabeça de ninguém, pois não?
Além disso, às vezes sinto que há algum preconceito com o facto de um ser heterossexual querer ler ou ver filmes sobre relações homo/bissexuais. Não sei se já o sentiram, mas quando coloquei nas Instagram Stories que estava a ler o Call me by your name recebi uma mensagem que me deixou um bocadinho perturbada porque era alguém a perguntar-me o que é que levava uma pessoa como eu (leia-se heterossexual) a querer ler um livro sobre uma história gay. Fiquei mesmo perturbada com a pergunta, porque achei que era a coisa mais discriminatória que já me disseram.
É normal que me identifique mais com romances heterossexuais porque, afinal, são aqueles que me consigo imaginar totalmente a viver, no entanto isso não impede que queira ler um livro ou ver um filme como este. Acredito que são histórias como estas que nos abrem mais a mente, que alargam a nossa zona de conforto, que nos mostram outras realidades. E isso é completamente necessário. Se querem saber uma coisa aqui entre nós, nas primeiras páginas do livro não se conhece a entidade do narrador e juro-vos que até 12% do livro, se não soubesse ao que ia, poderia pensar que era uma rapariga a descrever o rapaz de quem gostava porque era totalmente plausível. A maior parte destes preconceitos estão nas nossas cabeças e se pensarmos neles percebemos que são absolutamente ridículos. Por isso leiam o livro, vejam o filme, conheçam outras histórias, cresçam, ganhem mundo. É tão bom!
Quem também participa no Movie 36
Lyne, Imperium
Francisca, Apenas Francisca
Inês, Vivus
Vanessa, Make It Flower
Joana, Jiji
Inês, Wallflower
Abby, Simplicity

6 Replies to “LIVRO VS. FILME: CALL ME BY YOUR NAME”

  1. Adorei, Sofia! E quero muito ler o livro e ver o filme (foi um dos que acabei por não ver na maratona dos Óscares, para muita pena minha). Concordo com tudo o que disseste em relação à necessidade quase absurda de rotular este filme como um filme homossexual. Do pouco que li de reviews de outros bloggers, acho que é um romance, simplesmente, onde o objectivo não é falar necessariamente sobre dois homens que se amam, mas sobre uma história de amor, tão simples quanto isso. Principalmente depois desta tua review, tenho ainda mais vontade de ler (e ver!) esta história. ♥️

    Beijinhos,
    Sónia R. Pinto
    By the Library

  2. Excelente análise! Quando vi o filme, não sabia da existência do livro, se não tinha-o lido antes, mas ainda assim quero muito lê-lo.
    Aquilo que eu mais gostei neste filme foi precisamente o facto de retratar um romance entre dois homens, sem ter necessidade de rotular. Uma história de amor como tantas outras. Daí a minha revolta ser ainda maior quando também me perguntaram isso. Cheguei a fazer uma publicação sobre isso mesmo, uma reflexão sobre se seria assim tão estranho me identificar com este filmes, e escusado será dizer que a conclusão foi mesmo essa, é mesmo discriminação acharem isso. O amor é um sentimento universal e, parecendo que não, mesmo sendo heterossexuais, podemos identificarmo-nos mais do que aquilo que pensamos.
    "Olá, pessoal, olhem tenho de vos dizer isto… já devia ter dito antes, mas não deu. Bem, cá vai! Eu sou heterossexual! Isto não cabe na cabeça de ninguém, pois não?", ahahahah, isto fez-me lembrar uma cena que apareceu no trailer do filme " Love, Simon", em que os outros lembram-se de saírem também do armário e de se assumirem perante a família como heterossexuais, a reação deles é priceless xD.
    Beijinhos
    Blog: Life of Cherry

  3. Bem, nem sequer consigo compreender a pergunta que te fizeram, a mim não me faz qq sentido. Sou heterossexual e nos meus livros tenho casais homossexuais – gays e lésbicas, ambos. Aliás, em dois dos meus livros faço questão de descrever o processo de atracção e enamoramento por parte de um membro de um desses casais, porque na verdade uma história de paixão é sómente isso: uma história de paixão, não importa entre quem. O livro Lolita, que descreve com pormenor a relação de um homem de meia idade com uma adolescente devia dar cabo das cabecinhas de quem comenta que a relação entre alguém de 17 anos e alguém de 24, 26 roça a pedofilia. Nem quero imaginar se fossem ler Anaïs Nin o que é que diriam essas pessoas. Mas o mais engraçado é que parecem achar plenamente normal um vampiro imortal de não sei quantos anos meter-se com uma pita de 15, como no Twilight… sinceramente, acho as novas gerações tão mais tacanhas do que éramos quando eu estava na adolescência, em que devorávamos livros pelo prazer de conhecer, de saber, de abrir a mente e descobrir novas realidades, novas formas de estar, de sentir, de pensar. Aliás, se calhar é mesmo por a maioria das pessoas hoje em dia só lerem as mesmissimas coisas é que há tantas vistas curtas por aí. Love is love is love is love, já dizia o outro…

  4. Não tenho palavras para descrever a importância deste livro/filme no meu início de ano. É uma história magnífica e que me tocou de forma muito especial. Concordo com tudo o que dizes, excepto numa coisa: entendo o lado positivo que queres transmitir ao dizer que o filme não deve ser rotulado como homo/bi (sendo que as personagens, na minha opinião e do que vou lendo, são bissexuais, tal como também disseste) mas sim como uma história de amor como as outras. No entanto, devido ao preconceito que ainda existe no mundo para com as pessoas LGBT, é importante haver filmes, séries, músicas, etc, ainda com esse rótulo. Por uma questão de representação, precisamente para desmistificar e para que todos possam perceber que somos todos iguais. Um pouco como a diferença entre um movimento ser "Black lives matter" e "all lives matter", entendes o que quis dizer?

    Em relação a dizerem-te que não podes consumir histórias de amor LGBT por seres heterossexual… Sem comentários! Todos somos livres de acompanhar as histórias de amor que quisermos! <3

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