O Conceito de Ler Muito e A Mania das Comparações

No início do ano vejo sempre pessoas que dizem querer ler mais, que aderem ao desafio do Goodreads, que dizem querer ler X livros naquele ano. E também pessoas que dizem que não gostam de estabelecer quantos livros vão ler, que dizem que o desafio do Goodreads não as atrai porque não gostam de ler para conquistar metas. And so on.

Também acontece, ao longo do ano, haver quem me diga que leio muito, que queriam ler tanto como eu e por aí adiante. Até percebo que digam que leio muito: li 74 livros no ano passado e 66 no ano anterior. Talvez seja muito. Mas há algo errado aqui: não deviam querer ler tanto como eu, não deviam estabelecer um número de livros que querem ler só para lerem para a meta, não deviam usar o Goodreads só para o desafio deles.

O que é ler muito?

Vou ser-vos sincera: sempre que alguém diz que lê um livro por mês eu fico realmente feliz. Acho que é muito bom e já é um hábito saudável e importante. Um livro por mês são 12 livros num ano. Já é muito bom. Mas também acho muito bom ler 2 livros por mês, ou três, quatro, cinco, o que for. O conceito de ler muito ou de querer ler mais é um conceito relativo e variável.

Para mim, ler mais pode ser ler 100 livros num ano, porque é mais do que costumo ler. Para ti pode ser ler 24 livros num ano porque costumas ler 12. Ler mais é só uma questão de ler mais um livro. Ler muito é que já é algo quase como a arte: cada um tem uma interpretação diferente. Para mim é um conceito que nem faz sentido debater. Eu acho que leio muito, porque leio praticamente todos os dias, porque quero sempre ler mais e mais. Não é pelo número de livros ou pelo número de páginas, mas pela vontade que tenho de ler e pela rotina de leitura que tenho.

Estabelecer metas: bom ou mau?

Depende. Se gostas de estabelecer metas ou se funciona para ti, é bom. Se não gostas de estabelecer metas ou não é algo que funcione para ti, é mau. Tão simples quanto isso. Eu, por exemplo, gosto de estabelecer metas, delinear objectivos e organizar-me para conseguir atingir o que quero. Como gosto de o fazer gosto também de definir quantos livros quero ler num ano.

Mas, tal como nos outros objectivos, faço-o de forma consciente: vejo o meu historial, penso no que tenho para fazer nesse ano, pondero quantos livros quero ler e vejo quantos preciso de ler por mês para conseguir atingir o meu objectivo. Mas se vir necessidade de diminuir ou aumentar o número de livros que quero ler num ano também o faço. Tal como todos os objectivos, tenho essa elasticidade para me adaptar.

Não leves a mal, mas se não gostas de definir quantos livros queres ler então a solução é simples: não definas. Lá porque eu e algumas pessoas definimos, não quer dizer que tenhas de o fazer também. Eu gosto do desafio do Goodreads, mas o Goodreads não é a minha rede social preferida por causa do desafio: é porque posso ver o que os meus amigos estão a ler, comparar livros e opiniões e apontar o que penso. O desafio nem sequer é obrigatório.

O Problema é Comparar

Passo grande parte do ano sem pensar sequer no número de livros que estabeleci. Vou lendo, às vezes mais, às vezes menos, e não leio para o número. Ler por ler não resulta comigo. Eu sou aquela pessoa que deixa livros por terminar se não está a gostar, por que raio ia ler só para dizer que li X livros? Claro que há um pequeno problema: é que a galinha da vizinha é sempre mais bonita e nós vemos a vizinha partilhar a leitura da galinha e começamos a comparar números, mas sabe-se lá se o que a galinha leu era bom ou não.

Desafios Literários vs. Clubes de Leitura

Gosto de ambos, sinceramente, mas são coisas diferentes e há que as manter em sacos diferentes. Os desafios literários normalmente estabelecem um número específico de livros ou obrigam-vos a estabelecer esse número. Podem servir como incentivo, sim, mas não devem vê-los como competição. Ler não é uma questão de competir.

Já os clubes de leitura podem funcionar por temas mensais ou por livros específicos, mas não obrigam a ler todos os meses nem vos dizem quanto têm de ler. São um bom incentivo porque nos dão ideias para ler e também porque pode haver interacção com outros membros, o que nos motiva. Se estiverem interessados em participar num, têm o The Bibliophile Club.

Em conclusão…

Eu acho muito bem que as pessoas queiram ler mais e que pareça estar na moda ler. Acho mesmo muito bem, acho que é excelente e só faz bem. Acho, no entanto, que ninguém se devia sentir pressionado a ler determinado número de livros.

Se eu leio 5 num mês e tu lês 2, não devias sentir-te pressionado a ler o mesmo que eu, nem deves sentir-te melhor ou pior pelo número de livros que lês. Cada um lê ao seu ritmo, cada um lê conforme faz tempo para ler, cada um vai ler sempre coisas diferentes. Temos de parar de comparar números assim. Repito: se não te sentes confortável a estabelecer números de livros ou se pensas que te sentirias frustrad@, não estabeleças um número de livros.

Continuo a achar que só o acto de ler, não importa quantos livros, quantas páginas, já é muito positivo e o ler é que é importante. Se, por outro lado, gostas de estabelecer números de livros, então não tens de te sentir mal por o fazer, nem por dizeres quantos livros leste. Não acho que seja caso para nos vangloriarmos, porque não há motivo para tal, mas dizer que leste 10, 20, 30, 50, 100 livros num ano não é crime, não é mau. Leste. E isso é que importa.

Já agora, podes acompanhar-me no Goodreads.

4 Replies to “O Conceito de Ler Muito e A Mania das Comparações”

  1. Ai, sim!! Por favor, por mais textos destes a esclarecer que não há mal algum em cada um ter o seu tipo de organização e que cada pessoa é uma pessoa!

    Já me senti pressionada em ler mais porque os outros liam determinado número de livros, mas depois distanciei-me desse meio e passei a estar mais consciente em relação àquilo que eu queria! Assim que estabeleci esse hábito, tudo melhorou e leio o que me der na cabeça, na alma, no coração.

    No ano passado, li 14 livros. No anterior, uns 34. Para este ano, estabeleci 24, um meio termo, e sei que é possível, dado que ler é algo que me dá prazer, logo, é uma semente que tenho de cultivar!
    Temos mesmo de deixar de comparações, pois, só nos faz mal!!
    Belo texto, Sofia! ??????

    LYNE, IMPERIUM BLOG

  2. Irrita-me, profundamente, que as pessoas entrem nestas competições e comparações desnecessárias. Cada um tem o seu ritmo de leitura e não há qualquer mal em não "apresentarmos" números astronómicos. O importante é que as pessoas tenham gosto em ler e retirem prazer nesse momento. Não é a quantidade que importa, é o quanto uma história nos marca.
    Se uma pessoa com zero hábitos de leitura chegar ao fim de um ano com um livro lido, para mim, é maravilhoso, porque evoluiu. E isso tem que ser valorizado; a pessoa tem que valorizar o seu esforço e não ficar a pensar que é pouco, tendo em conta que o vizinho leu 20. Porque a predisposição é diferente, porque a disponibilidade é diferente e porque temos níveis diferentes de adoração pela leitura.
    Tal como na vida em geral, na leitura não podemos fazer coincidir as nossas pegadas nas dos outros, temos, sim, que vincar as nossas

  3. Tal como várias pessoas lidam de forma diferente nas mesmas situações, nós próprios também temos os nossos momentos. Com isto quero dizer que tanto num dia me apetece ler muito, como no outro prefiro deixar um livro de lado e fazer outra coisa. Como disseste e bem, não tem mal.
    Temos de aprender que o nosso ritmo tem o seu valor e não é mais nem menos do que o ritmo de outros.

    Como a Lyne disse acima, e só posso concordar: "Temos mesmo de deixar de comparações, pois, só nos faz mal!!"

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