o zen e a arte da escrita [ray bradbury]

Tenho uma relação um bocadinho tóxica com livros sobre escrita: sei que os posso ler todos e que isso não me fará melhor escritora por isso não preciso de querer ler todos, mas, mesmo assim, quero ler todos. Normalmente não é um problema, porque tenho sentido que todos os que vou lendo me acrescentam algo, mas, neste caso, houve algo que não funcionou na leitura de O Zen e A Arte da Escrita e atrevo-me a dizer que o problema não é do livro, é meu.

Talvez tenha sido arriscado escolher para primeiro livro do Ray Bradbury um livro de crónicas, mas decidi oferecê-lo a mim mesma no natal de 2022 e não ponderei sequer ir primeiro para o grande livro dele — Fahrenheit 451. Já comecei a ler alguns autores por livros sobre escrita e correu tudo bem — aconteceu com a Elena Ferrante e com a Leïla Slimani. Neste caso não correu tão bem, mas já lá vamos.

O Zen e A Arte da Escrita reúne vários textos escritos ao longo de trinta anos (todos eles com o ano de escrita detalhado). Nestes textos, Bradbury fala sobre o entusiasmo da escrita, mas também reflete muito sobre a sua carreira e sobre os livros e as centenas de contos que escreveu, com uma certa componente biográfica associada a estes momentos.

Apenas o seguinte: se estão a escrever sem entusiasmo, sem prazer, sem amor à escrita, sem se divertirem, estão a ser escritores pela metade. Ou seja, estão tão preocupados com o que vende ou de tal maneira pendentes do que pensa a capelinha avant-garde que não estão a ser vocês mesmos. Tão-pouco sabem quem são, na verdade. Porque, antes de tudo o mais, um escritor deve ser entusiástico. Deve ser de febres repentinas e deve empolgar-se com as coisas. Faltando-lhe esse vigor, mais vale que se dedique à apanha do pêssego ou a cavar; sabe Deus que lhe fará melhor à saúde.

Ora, comecei cedo a perceber que algo não estava alinhado para mim. Não sinto que tenhamos de ter lido a obra dele para ler o livro, mas também não fiquei propriamente com vontade de ler a obra dele depois de ler as crónicas. Além disso, não sei se é de ler em português, mas a escrita não me atraiu por completo e acabei por ir lendo o livro quase como se fosse uma tarefa inevitável.

Sei que dizer que não funcionou muito bem para mim se calhar até diz mais sobre mim do que sobre o livro, porque sinto que pode ter pontos fundamentais para muita gente… só que, para mim, esses pontos desapareceram rapidamente e não tirei tanto deste livro quanto achei que tiraria. Recomendo, isso sim, aos fãs do autor, porque acho que deve ser muito bom ter esta visão privilegiada para a forma como o próprio escritor vê a sua obra. Eu dar-lhe-ei uma oportunidade em Fahrenheit 451, certamente.

Título original: Zen in the art of writing
Título em português: O Zen e a Arte da Escrita
Autor: Ray Bradbury
Ano: 1973 (PT: li a edição de 2019)

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