- Quando: 7 a 9 de janeiro de 2024
- Gatilhos: violência; sexo
Quando fiz anos, em novembro, recebi um cartão-oferta da Fnac e soube imediatamente que iria para um livro, só não sabia qual. As hipóteses eram vastas, mas havia algo que me dizia que era a altura certa para finalmente pegar na obra da Carla Madeira. Trouxe o Tudo é Rio, disposta a seguir a ordem de publicação, apenas com duas certezas em mente: era um livro recomendado por muita gente em quem confio e era, aparentemente, um livro polémico. Com a polémica até me sentia mais atraída.
Tudo é Rio traz um triângulo relacional um tanto peculiar. Temos Lucy, a prostituta mais desejada da cidade, Dalva, a mulher tradicional e luminosa, e Venâncio, o marido loucamente ciumento de Dalva. Dalva e Venâncio seriam o casal perfeito, afinal a intensidade do amor que os unia é única. No entanto nem sempre a intensidade se revela um bom presságio.
O amor tem nome, mas não é nada que possamos reconhecer só de olhar. A dor nós sabemos o que é, tem lugar e intensidades que cabem na ciência. A raiva, o medo, o ódio entortam a cara com um jeito provável de se manifestar. Mas e o amor? O que é senão um monte de gostar? Gostar de falar, gostar de tocar, gostar de cheirar, gostar de ouvir, gostar de olhar. Gostar de se abandonar no outro. O amor não passa de um gostar de muitos verbos ao mesmo tempo.
Sem querer desvendar muito da história, até porque não foi a parte que mais me cativou, senti que esta foi uma ótima forma de estreia na obra da Carla Madeira. Gostei muito da escrita, que anda ali num equilíbrio fascinante entre a crueza e a beleza, e notei uma certa poesia bem ritmada enquanto lia, possivelmente vinda do facto de ser português do Brasil. A história não foi, para mim, propriamente espetacular e não teria escolhido um final assim, mas valeu pela escrita.
Acho que o facto de o livro mexer um bocadinho com o pecado e com a oração lhe deu um toque especial, mas não senti que romantizasse a violência e não me afastei quando a religião ocupou ali um espaço maior — embora ache que não precisava da religião para nada. Num livro em que sexo é liberdade e prostituição é escolha, torna-se fácil perceber que haja algum choque de ideias com mentes mais conservadoras, mas foi algo que achei que resultou bem na narrativa. Avançarei para as outras obras da autora mais para a frente no ano.
Conheço, mas nunca me senti tentada a ler. Talvez um dia lhe dê uma chance.