Houve uma altura em que escrever um blog era tão fácil quanto abrir o editor e escrever. Depois os blogs complicaram-se. Ou, sendo justa, nós complicámos os blogs. Já não escrevemos num blog, criamos conteúdo digital. Somos content creators.
Nos últimos anos tenho sentido uma dificuldade crescente em saber o que quero do meu blog. Quero criar o tal conteúdo, mas não quero criar só conteúdo. Quero simplificar e só escrever, mas pergunto-me se ainda sei escrever um blog. Só escrever.
Eu tento, mas não consigo fugir da comparação entre a escrita e o exercício físico...
Há uns anos, comparei a escrita ao exercício físico e nunca mais deixei de o fazer porque é uma comparação que continua a fazer sentido para mim.
Vamos supor que és uma pessoa que não pratica exercício físico há meio ano, mas antes disso até eras uma pessoa activa. Decides que está na altura de voltar e hoje vais voltar. Escolhes a tua roupa, fazes uma playlist cheia de músicas enérgicas e planeias o teu treino. Vais começar com trinta minutos, mas se calhar perdeste bem mais do que trinta minutos a escolher roupa, música e exercícios. Finalmente começas o aquecimento.
Nos primeiros segundos sentes-te espectacular, porque estás a cumprir com o que decidiste. Depois começam as dores. O teu corpo parece estar completamente preso, amarrado. Sentes dores em lugares onde nunca pensaste sentir dor. Pensas que talvez esteja quase no fim, mas só passaram cinco minutos. Fazes uma pausa. Voltas mais cinco minutos. Fazes outra pausa. E assim sucessivamente.
No final sentes-te tão cansado como se tivesses feito a maratona. No dia seguinte ainda te sentes pior e parece que te esqueceste de como caminhar ou de como te sentares. Mas sabes que para recuperar precisas de voltar a treinar. Fazes outro treino. Novamente cinco minutos, uma pausa, cinco minutos, uma pausa. Isto dura uma semana. Na semana seguinte consegues sete minutos, uma pausa, sete minutos, uma pausa. No mês seguinte já vais em dez minutos. Dois meses depois ficas bem com uma pausa curta aos quinze minutos. Seis meses depois já nem te lembras do sofrimento inicial.
Para mim, voltar a escrever é exactamente como voltar a treinar. É escolher o momento e o cenário ideal, é gastar demasiado tempo a pensar na música certa e é fazer todo um texto mental antes de começar, de facto, a escrever. Depois é sofrer, quase fisicamente, para começar a escrever. É sentir a concentração dispersar ao fim de poucos minutos. É sentir que os dedos não mexem tão depressa quanto costumavam. É sentir que o pensamento não é tão rápido quanto costumava ser.
É escrever dois parágrafos e ficar mentalmente exausta. Mas voltar no dia seguinte e escrever mais dois. E no outro mais dois. E por aí adiante até que escrever dois parágrafos volta a ser a actividade mais leve de sempre e escrever deixa de causar dor por dificuldade e passa a causar apenas dor por excesso de tempo sentada e por estar a criar calos nos dedos.
Voltar. Ficar. Parar.
Há alturas em que me sinto incrivelmente próxima da escrita, em que escrever é tão simples quanto respirar (pelo menos para quem não tem problemas respiratórios). Mas há outras em que me sinto tão longe da escrita como estou de Plutão, em que escrever é como resolver aquela equação do Good Will Hunting.
Numa fase em que tenho escrito tão pouco, queria falar-te sobre a parte do voltar. Já a fiz tantas vezes que já a conheço melhor do que me conheço. No entanto apercebi-me de que falo sempre sobre isto quando volto depois de estar afastada uns tempos. Sinto-me um disco riscado.
Então quero antes falar-te sobre o tempo entre o ir e voltar. Sobre as horas que tenho passado rodeada de cães e de gatos, sobre como ontem fui arranhada por um gato e anteontem vi uma cadela em trabalho de parto. Sobre como sinto que cresci meio metro no último meio ano, embora a minha altura se mantenha. Sobre como estou a ver um sonho tão perto e tão longe.
Quero falar-te sobre como acho que estou a atrasar a leitura de Uma Terra Prometida porque não me quero despedir do Obama (embora também esteja a ouvi-lo no podcast que ele tem com o Springsteen). Sobre como o meu Notion está a abarrotar de ideias por concretizar e sobre como gravei quatro vídeos para o Reels numa hora de almoço.
Às vezes ainda quero ser só escritora. Outras vezes lembro-me de que um escritor nada é mais do que uma pessoa que parou algum tempo a observar o mundo antes de escrever sobre ele.
Talvez esteja na hora de pegar nessas observações e fazê-las ganhar outra vida. Noutros tempos escrever um blog era simplesmente isto: observar o mundo e escrever sobre ele. Se calhar não é a arte que está perdida. Somos nós. Sou eu.
Sinto que isto também acaba por acontecer devido à cobrança que, consciente ou inconsciente, nos vamos fazendo. Porque é entusiasmante criar conteúdo, mas, depois, sentimos que temos de seguir sempre o mesmo caminho e há coisas que parecem deixar de encaixar.
Mas acredito que, pouco a pouco, nos vamos libertando destas sensações e nos aproximamos mais da essência: aquilo que a escrita representa para nós
Perdermo-nos para nos reencontrar. Só se perde quem tenta ir a lado algum, já tu mo tinhas dito. E guardo-o, desde então, pelo sentido que me continua a fazer. Apontas dois exercícios que, além de essenciais das nossas vidas, quando postos em prática, reequilibram o que significam para nós. Custa sempre, sobretudo em fases mais controvérsias da vida… Porém, sabes que sempre estarão ali para ti. É só manter a calma e respeitar o momento!
Besitos,
Lyne, Imperium Blog
Congresso Botânico – Podcast
Como eu me revi neste post! Já perdi a conta às vezes que comecei um blog… escrevia, publicava e passado um tempo relia o post e achava que era uma porcaria, que ninguém iria querer ler aquilo ou que já há muita gente a escrever o mesmo.
Quando comecei a pesquisar sobre “como criar um blog” há uma certa pressão em ter de encontrar um nicho específico, o SEO, a monetização e a quantidade de visualizações… todo um leque de pormenores que automaticamente nos faz esquecer o verdadeiro propósito do que quero fazer: escrever num blog meu.
Não tem sido fácil, mas ler o teu blog dá-me esperança de não voltar a desistir e fazer algo que EU gosto, e se houver leitores/seguidores que gostem então tanto melhor.
Beijinhos e obrigada! 😉