até ao próximo concerto, lisboa!

Quando esvaziei o quarto minúsculo em que vivia nas Olaias, em dezembro de 2019, tinha três regressos a Lisboa marcados para 2020. Saí muito feliz. Nunca devia ter voltado, porque já não queria estar ali, mas naquele momento estava a ir embora para voltar apenas para eventos esporádicos e 2020 trazia três concertos: GNR em fevereiro, Taylor Swift no início de julho, Harry Styles uma semana e tal depois. Ainda fui aos GNR, com a minha mãe, e sonhei com o regresso em julho, para ver a Taylor no Alive, mas já sabemos o resto da história, certo? Pandemia, eventos cancelados, dinheiro devolvido, etc., etc. O meu regresso a Lisboa sempre foi suposto ser para a Taylor, só demorou mais quatro anos do que era suposto.

Algo que surgia por vezes em conversa era o regresso a Lisboa: Não tens saudades? Não gostavas de voltar a viver lá? Não achas que terias mais oportunidades lá? Como achas que vai ser voltar?

Não tinha saudades, não queria voltar, não me importava a possibilidade de oportunidades, não sabia como ia ser voltar. Será que ia sentir o sufoco do último ano ou a tranquilidade dos primeiros anos? O primeiro impacto com Lisboa deu-se na estação do Oriente, na qual passei horas da minha vida ao longo de todos os anos que vivi em Lisboa. Foi engraçado perceber que a minha mente tinha o mapa da estação bem gravado e que me dirigi às máquinas dos bilhetes dos comboios como se o fizesse diariamente. Devo ter passado por espécie local porque fui logo abordada para ajudar pessoas.

Claro que podia ainda saber como funcionava Lisboa, mas a versão de mim que estava ali era a versão portuense, portanto quando o comboio parou em Entrecampos e em vez de deixarem sair quem estava dentro do comboio (eu incluída) começaram a tentar entrar primeiro foi a versão portuense que disse, bem alto: Foda-se, deixem passar, caralho! Sim, bem alto. Porque aquilo pode ser Lisboa, onde um advérbio de intensidade destes é visto como palavrão, mas a falta de civilização exige medidas extremas e eu estou cá para despejar foda-ses sempre que é necessário.

Ora, nesse dia ainda tentámos ir comprar merch ao Capitólio, mas já tinham fechado o acesso às filas e, por isso, caminhámos ali pela zona, subindo do Marquês de Pombal até Picoas, e foi aqui que se abateu uma questão: que cidade barulhenta! Eu queixo-me do barulho de fundo constante da minha rua, sei que existe sempre barulho de fundo em todo o Porto, na verdade, mas Lisboa terá sido sempre assim barulhenta ou ficou pior? Não é barulho de fundo, é barulho que nos invade de tal forma que parece que nos acompanhará para o resto da vida, passível de ser ouvido até a milhares de quilómetros.

Só no sábado voltei a ter tempo com Lisboa e foi nesse tempo, sentada num banquinho do Parque das Nações a olhar para o Tejo, que realmente me caiu a ficha de que já estava farta de lá estar. Ainda tenho entranhados percursos, ainda sei dar indicações e não perco o ritmo entre aquelas pessoas, mas dei por mim sem vontade de ir a qualquer sítio que fosse. Não me apeteceu ir ver o Cais das Colunas, que foi o meu porto de abrigo no primeiro ano, não me apeteceu ir fingir saudades do Starbucks dos Armazéns do Chiado, ponto de estudo e escrita durante quatro anos, não me apeteceu ir a miradouros, a restaurantes da moda nem percorrer corredores de centros comerciais. Durante todo o dia de sábado só me apetecia mesmo voltar para casa, onde posso mirar mesmo o Douro, onde os centros comerciais têm as mesmas lojas e onde o barulho é de fundo e não somos nós a ser de fundo.

Escrevi há pouco tempo que Lisboa só é aceitável em doses pequenas e, para mim, essa é a realidade. Lisboa é o sítio dos espetáculos, agora. Não, não me deu saudades de lá viver. Não, não me deu saudades da pessoa que fui. Não, não voltaria a viver lá. Sim, teria mais oportunidades de perder todo o tipo de saúde mental lá. Sim, voltarei para concertos sempre que fizer sentido. Já fizemos as pazes há muito tempo, por isso estamos bem, ambas sabemos o que fomos e o que queremos ser. Até ao próximo concerto, Lisboa!

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