meio sol amarelo [chimamanda ngozi adichie]

Meio Sol Amarelo estava na minha lista há anos. No ano passado, na Feira do Livro, peguei-lhe, mas decidi não trazer porque sabia que não o ia ler logo. Gostei muito do Americanah e entretanto até li os dois livros dela sobre feminismo, mas parecia que estava difícil voltar à ficção da Chimamanda. Felizmente, o Clube do Livra-te de setembro trouxe o pretexto ideal. Acabei por ler o livro através do Kobo Plus, o que facilitou a leitura porque é um calhamaço de 700 páginas e uma leitura densa.

Este livro acontece em dois momentos: no início dos anos 60 e no fim dos anos 60, na Nigéria e no Biafra. Dividido em quatro partes (que alternam entre início e fim dos anos 60), Meio Sol Amarelo apresenta um conjunto de personagens distinto: temos Ugwu, uma criança de 13 anos que vai trabalhar como criado de Odenigbo, um professor universitário; as gémeas Olanna e Kainene, que são de uma família de classe alta ibo; e Richard, um jornalista aspirante a escritor que se muda de Londres para a Nigéria. Aqui, Olanna e Odenigbo mantém uma relação apaixonada e meio incompreendida pela família e Richard apaixona-se por Kainene.

Mini-lição de História Mundial

Para falar melhor do livro, acho que é mais fácil dividi-lo em duas áreas: o drama familiar e a ficção histórica. O período histórico em que a obra se desenrola é um período particular na história da Nigéria e de toda a África. A Nigéria foi uma colónia britânica e só em 1960 se tornou totalmente independente. Como aconteceu em muitos países africanos esta independência trouxe várias questões e divisões de fronteiras complicadas. Maioritariamente, o norte tinha os hauças (muçulmanos), o sudoeste tinha os iorubás e o sudeste os ibos. É neste cenário de independência recente com sinais de problemas internos que as partes do início de anos 60 acontecem.

Já as partes de final de anos 60 recaem sobre algo que aconteceu em 1965: alguns motins resultaram na morte de 30 mil ibos e, por isso, em 1966 um grupo ibo prepara uma revolta militar com o objetivo de se separarem da Nigéria. Meio ano depois, um grupo oposto, constituído maioritariamente por hauças, organiza um golpe de estado. Em massacre completo, em 1967 é declarada a República do Biafra, no leste da Nigéria. Além das visões religiosas, há também o problema clássico do petróleo (em zona controlada por ibos) e existe também uma espécie de receio económico em relação aos ibos — muito ao estilo do que aconteceu com os judeus na Alemanha. São um grupo com grande poder económico e são também o grupo massacrado de forma devastadora durante a guerra.

O problema dos Ibos é que querem controlar tudo neste país. Tudo. Porque é que não ficam quietinhos na sua Região Leste? São donos de todas as lojas e controlam a função pública, inclusive a polícia. Se uma pessoa for presa por um crime, basta saber dizer “keda” que é logo posta em liberdade.

É neste cenário que as personagens vão vivendo as suas vidas. Se a situação política e, posteriormente, a guerra são preocupações constantes a verdade é que as vidas deles também o são. Entre desavenças familiares, traições, filhos e até um certo coming of age do Ugwu, este é um livro denso, com um ritmo muito próprio.

Eu gostei muito da experiência de leitura. A primeira parte é mais lenta, numa introdução mais detalhada de cada personagem, mas depois a segunda parte vem com tudo e a leitura parece ficar mais urgente. A escrita é, claro, muito bonita e crua quando tem de ser. É fácil perceber quase tudo sobre a desavença das irmãs, mas depois vem outro contorno familiar ainda mais impactante e meio inesperado, o que dá várias camadas à história.

Acho que é um livro que exige o estado de espírito certo, não só pelo ritmo e pelo tamanho mas também pela violência retratada durante a guerra. No entanto é um livro bastante bom e que tem um final daqueles — quando terminei fui procurar teorias sobre o final e encontrei um artigo em que a Chimamanda explica o motivo para escolher aquele final e, apesar de fazer sentido, tornou-o ainda mais sensível.

Título original: Half of a Yellow Sun
Título em português: Meio Sol Amarelo
Autora: Chimamanda Ngozi Adichie
Ano: 2006 (PT: 2017)

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2 Replies to “meio sol amarelo [chimamanda ngozi adichie]”

  1. Estou sem palavras para este livro extraordinário! Como é que uma história tão dura e tão angustiante consegue ser, ao mesmo tempo, tão bela? Fascinante

  2. É o segundo post hoje que leio sobre este livro. Antes de hoje nunca tinha sequer ouvido falar dele. Parece uma leitura interessante. 😉 Obrigada pela partilha.

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