americanah [chimamanda ngozi adichie]

Era para ter escrito sobre o Americanah há duas ou três semanas, até porque foi o livro que li em Abril para o Uma Dúzia de Livros, mas decidi esperar porque precisava de pensar um pouco mais sobre o que li neste livro inacreditável da Chimamanda Ngozi Adichie. O tema raça é muito importante aqui e vai constituir uma grande parte da narrativa. Calhou colocar esta review no calendário para Junho e, de repente, não podia vir mais a propósito.

Americanah: o sonho americano e a vida

Americanah é um livro literalmente pesado, não fosse este um livro com 720 páginas. O tamanho pode demover algumas pessoas, mas a história está tão bem escrita que aquelas 720 páginas se lêem muito bem e, no final, ainda ficas a pedir mais. Vi-o como um livro que não é só a história de amor de Ifemelu e Obinze, mas a história de cada um deles juntos e separados, onde a vida e a raça têm um papel determinante.

Ifemelu e Obinze namoravam desde a adolescência. Estão na universidade quando surge a hipótese de Ifemelu concluir os estudos nos Estados Unidos. Os Estados Unidos eram, para os nigerianos, El Dorado, o lugar mais desejado. Quando chega aos Estados Unidos, Ifemelu percebe que, afinal, os EUA não são a perfeição que imaginava e vê que a vida da tia também não é tão boa como imaginava.

Obinze devia ter ido para os EUA também, mas entretanto acontece o atendo às Torres Gémeas e Obinze não consegue visto. Em vez disso, tenta a sorte em Inglaterra, em Londres, como emigrante ilegal. Acompanhamos mais detalhadamente a vida de Ifemelu, mas também de Obinze, ao longo dos 13 anos que Ifem passa nos EUA. Nesses anos, Ifem passa dificuldades, mas toma uma nova consciência sobre raça, que na Nigéria. É por isso que ela cria um blog sobre raça, onde relata a sua experiência como negra não americana.

Para mim este livro é tão bom precisamente porque balança a relação de Ifem e Obinze com a vida, porque está muito escrito e porque de cada vez que a raça levantava um problema eu ficava com um nó no estômago, a contorcer-me com o meu próprio privilégio.

O privilégio que tanto tememos reconhecer

Durante a maior parte da minha vida não me considerei privilegiada: cresci com recursos limitados, vi os esforços da minha mãe em tentar ter uma vida melhor e em guardar dinheiro para o meu futuro, usava roupa em segunda mão, cada gasto resultava de poupanças de muito tempo, cheguei a ter a escola a dar-me pequeno-almoço gratuito porque a situação estava mesmo má. Mas fui sobrevivendo. À medida que ia crescendo percebi que era discriminada por ser filha de mãe solteira, por não ter muitas posses financeiras e até por ser rapariga. Mas nunca fui discriminada pela minha cor. E aí percebi o que era o privilégio branco.

Quando me apercebi de que, afinal, tinha um privilégio precisei de me educar, de perceber o mundo em que vivo. Reconheci e reconheço o meu privilégio. Nunca fui olhada de lado por ser branca, nunca fui discriminada na rua, no supermercado, num processo de recrutamento por ser branca. Não cresci a aprender como me comportar se a polícia me mandar parar. Não tenho medo de ser agredida física e psicologicamente pela minha cor de pele. E isso é privilégio. Porquê ter tanto receio de o reconhecer?

I understand that I’ll never understand, but I stand.

Sei perfeitamente que não são estas palavras, nem as imagens ou hashtags que partilhe que vão mudar o mundo, nem espero que seja o facto de termos publicados milhares de quadrados pretos no Instagram ou no Twitter que vai mudar o mundo. No entanto estou a tentar mostrar aquilo em que acredito e a dar o meu melhor, com os recursos que tenho. Só assim podemos evoluir. Só assim, com todos a usarmos a nossa voz, vamos obrigar alguém a ouvir-nos. 

Título original: Americanah
Título em português: Americanah
Autora: Chimamanda Ngozi Adichie
Ano: 2013 (PT: 2013)

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2 Replies to “americanah [chimamanda ngozi adichie]”

  1. Nem sempre é fácil reconhecermos os nossos privilégios, porque há problemas/dificuldades que sugam toda a nossa atenção. Portanto, acabamos por não ir por esse caminho. Mas quando nos é possível pensar nos assunto, não há qualquer mal em percebermos que precisamos de nos educar. Aliás, vamos precisar de o fazer toda a vida. Quando preferimos, mesmo assim, ignorar, aí é que já é mais problemático.
    Ando cheia de vontade de ler este livro. Tenho que tratar disso!

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