[esta publicação é muito geográfica. para quem não conhecer a zona se calhar é preciso abrir o Maps como material de apoio. pedimos desculpa pelo incómodo causado.]
Estava no meu último mês em Lisboa quando, pela primeira vez, consegui acertar sozinha, à primeira, na saída do metro do Saldanha. Sempre que precisava de sair no Saldanha saía no sítio errado. Sempre. Não acertava uma única vez. Queria sair junto à Duque de Saldanha e saía junto ao Arco do Cego. Se tivesse sorte saía só do outro lado da rua, mas normalmente saía mesmo na ponta oposta. Por mais vezes que saísse naquela estação não conseguia acertar.
Sempre que errava na saída do Saldanha lembrava-me de como, no primeiro ano, tinha esse problema em Sete Rios. Mas Sete Rios tinha sido tão fácil de controlar. O Saldanha enlouquecia-me. Eu, que me orgulhava de percorrer quilómetros a pé em Lisboa sem precisar de um mapa, mais orientada do que um escuteiro, não conseguia acertar na porra da saída do metro do Saldanha.
Até que veio aquele último mês. Queria sair na Duque de Saldanha, junto ao Monumental, por isso estava preparada para sair na Duque de Ávila e caminhar até ao local onde queria ter saído. Mas quando começo a subir as escadas percebo que estou mesmo a sair junto ao Monumental. Acertei na porra da saída. Fico a olhar para a rua como se fosse a primeira vez que ali saía. Não conseguia acreditar que seis anos e três meses depois conseguia acertar na saída do metro do Saldanha.
Não sei se a estação do Saldanha é realmente a mais confusa de todo o metro de Lisboa, mas para mim foi sempre a que mais me fez enganar. Questionava-me constantemente como é que era possível continuar a enganar-me. Quantas mais vezes saía ali mais vezes me enganava. A única vez em que não me preocupei com a saída, porque já ia a contar com outra, foi a vez em que consegui acertar.
Penso nisto agora, anos depois, porque tenho pensado muitos nas encruzilhadas em que me meto e em como estou sempre a enganar-me na saída. Por mais vezes que calhe neste sítio parece que nunca acerto na saída. Saía sempre perto, mas nunca no sítio certo. E às vezes perto não chega. Porque 300 ou 400 metros ao lado não faz muita diferença quando o objetivo é só ir comer um croissant ao Choupana e sais na Duque de Saldanha. Mas no resto da vida esses 300 ou 400 metros parecem mudar tudo: queres ir comer um croissant ao Choupana, mas sais da Duque de Saldanha então tens de atravessar dragões, vulcões em erupção, areia movediça e no fim ainda tens de resolver uma equação matemática qualquer. E se é para estares sempre a errar… bem, talvez esteja na altura de ir comer croissants a outro lado.
A vida tem parecido muito isto de tentar sair do metro na estação do Saldanha. Tantas hipóteses por onde sair e erras sempre. Gostava de perceber como deixar de me preocupar com a saída para finalmente acertar, mas está difícil. À medida que os erros se vão precipitando começa realmente a dar aquela sensação de que talvez esteja na altura de ir comer croissants a outro lado. Se calhar estamos sempre a errar porque aqueles não são os croissants que devemos comer e o universo, sabe-se lá porquê, preocupa-se com os croissants que comemos.
A vida tem mesmo parecido isto de tentar acertar na saída do Saldanha. Às vezes é na saída ao lado, às vezes é na saída mais afastada. Pergunto-me se é possível errar tanto, se é assim tão mau querer sair na Avenida da República para ir comer um croissant ao Choupana. Claro que isto não é sobre ir comer croissants, mas não é desolador sentir que o tempo passa e nós continuamos a errar a porra da saída? Talvez esteja mesmo na altura de ir comer croissants a outro lado, porque deste lado definitivamente só estamos a ficar mais pobres.
Giro: o lugar dos teus croissants guarda um dos meus piores momentos em Lisboa, onde fui roubada e senti-me tão vulnerável e frágil que nunca mais lá voltei.
Às vezes dói pensar que temos de ir comer croissants noutro lugar porque este foi tão bom para nós em outras ocasiões. E mal sabemos que há tantos lugares com melhores croissants, mais seguros e menos confusos de lá chegar.
Nem sempre é culpa nossa não sabermos mais ou melhor. Se eu não disser que fui assaltada lá, irá continuar a parecer um excelente lugar de croissants.
Talvez não sejas só tu que tem de ir comer croissants a outro lado. Talvez o lugar dos croissants também não mereça assim tanto uma visita – especialmente com um investimento tão grande para encontrares o Norte na saída.
Não sei qual é o melhor croissant para ti se não for este. Mas prometo-te que definitivamente não está no Saldanha e que, quando morderes um, nunca mais devoras outro.
Revi-me no teu post e também um bocadinho no comentário da Inês…talvez também para mim esteja na altura de ir “comer croissants” noutro lado.