Love? In This Economy?

A meio de Fevereiro, numa manhã aborrecida de terça-feira, instalei o Tinder. Achei que aquilo ia durar dois dias, que não ia ter qualquer match e que, no final, o propósito daquilo — sair do tédio e perceber se ainda sabia conversar com rapazes — não ia ter qualquer resultado. Enganei-me. Passei pouco tempo por lá nesse primeiro dia, mas em poucas horas tinha cinco matches e um deles tinha metido conversa. Eu achei que não ia ser nada. Por que raio havia de ser alguma coisa? Só que aquele nada tornou-se imenso. Não tudo. Nunca tudo. Mas imenso.

Nos últimos meses, pelo Tinder ou por causa do Tinder falei com muitas pessoas, conheci algumas também, e, no final, no dia em que decidi tornar o perfil privado e desinstalar a aplicação, aquilo que ficou foi esta sensação estranha de que se alguma vez acreditei no amor isso foi numa outra vida. Amor? Relações sérias? Pessoas que sabem conversar umas com as outras? Nesta economia? Não me parece.

Aos 18 anos não era bem amor...

Quando eu tinha 18 anos e escrevi as linhas finais do meu segundo livro, Seja O Que For o Amor, eu tinha consciência de que aquele tipo de amor — seja o que for o amor — não era bem amor. Era qualquer coisa parecida, talvez uma versão jovem, mas não era bem amor. Era só parecido. No entanto, passaram quase dez anos e eu ainda tenho de me referir ao amor como seja o que for o amor, porque continuo sem saber realmente o que é, onde está, para onde foi.

Naquela minha versão de 18 anos, de coração despedaçado, eu ainda acreditava no amor, acreditava que as relações entre duas pessoas eram simples, que tudo isto era fácil… só que, ao mesmo tempo, não era nada simples. Foi o meu grande desgosto amoroso e ainda bem. Três anos depois não custou tanto superar uma outra desilusão — o que me levou a concluir, mais tarde, que não gostava assim tanto dele — e, desde aí, mantive-me à margem dos sentimentos. Também eu — a miúda que sentia demasiado, que acreditava no amor, que escrevia romances — estava a ser engolida por esta sociedade em que sentir não acaba bem por isso o melhor é não sentir. Durante quanto tempo podemos não sentir? Não faço ideia. Mais tarde ou mais cedo vai acontecer, não é? Eu esperava sempre que fosse mais tarde.

A era das situationships...

Em todos os rapazes de quem gostei nunca vi um futuro real. Era tudo à base do agora, do momento, do para acontecer isto teria de acontecer X, Y e Z portanto não dá para imaginar muito. Quando achei que amei um deles, achei-o de uma forma estranha. Para mim fazia sentido dizer-lhe amo-te, mas provavelmente não fazia. Mas agora as coisas são diferentes. As pessoas ainda namoram? Okay, eu sei que namoram. Eu vejo fotos de casais nas redes sociais. Mas sinto cada vez mais que já ninguém namora, já ninguém quer namorar, já ninguém quer fazer o esforço de construir uma relação. Agora andamos todos entre situações.

Adoro o termo situationship. Adoro o conceito. Ou melhor, adoro como o conceito se propagou ao ponto de ter percebido que 99% dos rapazes com quem falei este ano querem uma situationship. Nem sei bem porquê. Medo de compromisso? Ter o sexo, parte da intimidade, mas sem ter a responsabilidade? Fingir que não se sente enquanto se passa meses a tratar a outra pessoa como quase-namorada, mas sem ser namorada?

Acho que estamos na era das situationships: as pessoas juntam-se pelo sexo, pela falta de intimidade, pela falta de carinho, mas cuidado ao tentar definir algo, ao tentar tornar isto em alguma coisa. As pessoas fogem a correr se o termo relação surge, embora tudo o que exista entre duas pessoas seja uma relação — até uma amizade é uma relação. Então de onde veio o medo das relações?

Mas é assim tão mau?

Não vou mentir. Eu ainda acho que o amor existe. Não acredito que dure para sempre, porque nada dura para sempre, mas acredito que o amor existe e que a certo ponto acaba, mas deixa algo. Só que também acho que hoje em dia algumas relações existem por solidão, ou por sexo, ou por ambos. Sinto cada vez mais que as pessoas não têm paciência para trabalhar as relações que têm ou que podiam ter.

Cada vez mais vejo pessoas procurar situationships que se adaptam à vida que têm em vez de tentarem também compreender como a vida se adaptaria à outra pessoa. Ou há traumas passados, ou há medos, ou há simplesmente preguiça em tentar descobrir como fazer funcionar. Mas às vezes… às vezes também compreendo que uma situationship é o único investimento que podemos fazer em determinado momento. Só que começo a perceber que talvez seja impossível não haver um ponto da situationship em que paramos a meio dos beijos para abrir os olhos e olhar para a outra pessoa enquanto nos perguntamos: Será que ele fica tempo suficiente para isto ser amor? Será que isto um dia passa a algo sério ou quando acabar vai ficar a sensação de que podíamos ter sido tanto mais? Quantas vezes preciso de me dar chapadas mentais para parar de ver estes vislumbres de futuro que continuam a surgir na minha cabeça?

Aquilo que aprendi em quase 5 meses a usar o Tinder

Neste momento, já é impossível sair ilesa desta experiência. Mais tarde ou mais cedo, vai tudo dar para o torto. Nestes praticamente cinco meses desde que instalei o Tinder aprendi mais sobre mim e sobre aquilo que eu penso do que sobre o mundo em geral. Ainda sou a pessoa que, sem sentimentos, perde interesse num instante. Não sei fugir dos sentimentos tão bem quanto achei que sabia. Ainda acredito no amor. Aquilo que existe entre duas pessoas vai sempre ser uma relação: se lhe chamas relação ou não já é outra coisa, mas é uma relação. As relações não são só amizades, namoros e casamentos.

Acima de tudo, tenho aprendido que tudo o que envolve duas pessoas relacionarem-se é bastante mais complexo do que eu acreditava ser aos 18 anos. Talvez fique pior com a idade, com as responsabilidades. Há o trabalho, há as experiências passadas, começa a haver os filhos. Talvez tudo fique mais difícil antes de ficar fácil.

Mas sabes o que é curioso? Eu não ia para o Tinder para procurar sentimentos ou para descobrir que ainda sabia ter esses sentimentos. Eu ia com a confiança de que ia fugir a correr assim que começasse a ver a pontinha de um sentimento. Tudo tranquilo. Não é preciso protecção para isto: é fugir a correr antes de eles chegarem. Impossível falhar, certo? Errado, claro. Porque os sentimentos chegam da forma mais aleatória possível, podes até vê-los chegar só de te sentares ao colo de alguém e essa pessoa colocar as mãos nas tuas costas para te fazer festinhas. E depois já não dá para fugir.

As pessoas podem já não ter paciência para construir relações, mas os sentimentos ainda existem, ainda chegam. Uns admitimos, outros não. Mas eles chegam. Eles vão chegando. O que fazemos com eles logo se vê. Provavelmente vamos acabar numa relação que não é uma relação, mas não deixa de ser uma relação porque tudo são relações, só que não podemos dizer que é uma relação porque é pior chamar a algo relação do que dizer foda-se na presença do papa. E sabes o que é mais interessante? Provavelmente nem te vais importar. Provavelmente só te vai interessar se a outra pessoa gosta de ti, mesmo que isto não seja sério. Provavelmente só vais querer continuar porque esta relação que não é uma relação, etc., etc., é algo de que gostas. Só não vamos esperar pelo amor. Aliás: esperar por amor? Nesta economia? Pero estamos locos, estamos locos!

One Reply to “Love? In This Economy?”

  1. A maturidade com que tens escrito estas reflexões não só me deixam a babar, como com um quentinho por ver refletidos pensamentos que também são meus! 🥺
    Sentimentos existem, o amor existe (mais perto do que julgamos)…. E não creio ser errado os plantarmos e manifestarmos. Faz parte da nossa experiência enquanto humanos, quem não aceita, ignora, usa para benefício próprio ainda tem muito que aprender…
    Amemos sempre, mesmo que doa. O crescimento que advém não tem preço!

    Beijinhos,
    Lyne, Imperium BlogCongresso Botânico – PodcastLivro DQNT

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