Era fevereiro. Aproximaste-te de mim para dois beijos de despedida e juro que havia uma corrente elétrica a ligar-nos.
Naquela altura a primavera parecia começar a mostrar-se porque já havia árvores floridas, mas estava um vento gelado, a despentear-me e a desafiar a minha escolha de vestir calções, e eu não tinha frio. Era aquela fase em que não sabia ainda se te achava mesmo piada ou se era só por saberes mandar-me áudios com o tom de voz certo, com pequenas provocações inocentes. Era aquela confirmação de que era mais do que uma química digital — era analógica.
Era fevereiro. Puxaste-me para me beijares pela primeira vez e juro que soube que me ia queimar.
O toque, a urgência, a certeza de que me ia arrepender daquilo em poucos minutos. Não era suposto ser assim, porque de certeza que não voltarias. Era uma espécie de cegueira causada pelo facto de sentir os teus lábios nos meus.
Era abril. Estávamos deitados na minha cama e juro que sentia que não era só eu a ganhar sentimentos.
Perguntava-me a quantas terias contado aquelas coisas, perguntava-me por que raio não tinha ainda fugido da situação. Mas dormias agarrado a mim e eu achava que havia sentimentos ali e que não eram só meus.
Era maio. Estava a adormecer encostada a ti no sofá do Diogo e juro que te sentia como o lugar mais seguro do mundo.
Caso perigoso, já não havia para onde fugir. Era assustador, mas mais assustador era não querer fugir. Fazias festinhas na minha perna e eu esforçava-me por não olhar constantemente para ti em busca de perguntas que não podia fazer-te.
Era junho. Estavas sentado na minha cama e juro que me passou pela cabeça que aquilo tinha sido uma despedida.
Havia uma distância estranha a forma-se entre nós e não podia ignorá-la, nem ela deixaria que eu o fizesse. Dias depois juntou-se à distância um silêncio estranho, que parecia ser possível de pesar — e pesava toneladas.
Era junho. Estavas a fumar à minha frente e juro que a minha vontade era pedir-te para te despedires devidamente antes de ires embora.
Não era tanto pelo ires embora fisicamente, mas por todas as versões de ires embora. Sabia que ias. Estava a ver-te afastar há semanas. Mas sem te despedires realmente como é que era suposto eu saber a partir de que momento não voltarias mais?
Era julho. Estava sentada no alpendre da minha mãe a escrever-te uma mensagem de parabéns e juro que sabia que estava tudo acabado.
Claro que não tinha coragem de o dizer, mas sabia que estava tudo acabado. Tu também não o dizias e eu ficava só a puxar assunto a tentar perceber até quando ias conseguir não o dizer.
Era agosto. Não dormia uma noite seguida há semanas e juro que me questionava como é que podia ainda ter tantas lágrimas para chorar.
Talvez antes tivesse sido a presença da Lady a manter-me segura, porque assim que a deixei tudo desmoronou. Noites sem dormir, lágrimas constantes e um silêncio perturbador. Odiei-te por teres feito exatamente o que eu sabia que não suportava — deixares-me no vazio, não dizeres o que estava a acontecer.
Era agosto. Tínhamos apenas um balcão entre nós e juro que ainda havia uma corrente elétrica a ligar-nos.
Como podia não pedir-te para voltares depois de sentir aquela corrente outra vez? Insisti, insisti, insisti. Depois de meses veio uma calma tremenda quando te forcei a seres sincero. Não devia ser preciso forçar-te a isso. Sabia que voltarias, mas agora eu precisava de me perder um bocado, de perceber o que não queria além de saber o que queria. Voltas ao mundo, estranhos a tentar qualquer coisa, histórias para contar — uma crise de identidade, uma fuga a coisas com as quais não queria lidar.
Era setembro. Ele disse algo que me mostrava que estava a perceber-me de uma forma assustadora para quem me tinha visto duas vezes e juro que tive de me esforçar para não chorar.
Tive medo, porque se ele tinha desconstruído tanto sobre mim em tão pouco tempo ele ia perceber-me muito mais rápido do que tu percebeste e, a continuar assim, será que me ia partir como tu partiste? Não importava, ele não és tu. Nunca vai ser.
Era setembro. Estavas a sair do meu carro e juro que naquele momento me veio à cabeça aquela frase do The Perks of Being a Wallflower: we accept the love we think we deserve.
Naquele momento sei que estou mais protegida, que não vai voltar a ser como antes. Naquele momento sei que aquela frase faz sentido, mas só a conseguimos compreender quando reconhecemos que merecemos mais do que aceitámos.
É outubro. Estou deitada na cama a olhar para as tuas mensagens e juro que vejo claramente aquilo que somos e aquilo que vamos ser.