Quando fiz 25 anos — nos meses antes, para ser mais específica — senti que estava a falhar. Sentia que já devia ter feito mais da vida, mais na vida. Nunca tinha viajado, estava longe de ter um trabalho de que gostava, estava ainda mais longe de ter algum tipo de estabilidade profissional e, a nível pessoal, sentia-me estagnada, perdida, assustada. Trabalhei tudo isto e outras coisas em terapia e tudo pareceu ficar bem. Esperava um susto do género quando chegasse aos 30, mas, pelos vistos, havia aqui algo reservado para os 27.
Desde aquela época terrível muita coisa aconteceu. Primeiro foram meses em casa durante uma pandemia. Depois um ano de trabalho intenso, em que aprendi imenso, mas em que também me questionei imenso, e daí saí logo para o mestrado, sem tempo de adaptação ou de meditação sobre o que estava a acontecer. No primeiro dia de aulas do semestre eu já me sentia dez anos atrasada. Então, por causa disso, só quando acabou o semestre e eu entreguei os trabalhos todos me permiti parar e pensar. Foi quando percebi que tinha mudado tanto nos últimos anos que já não sabia bem o que queria, quando queria, como queria. De repente já não tinha 25 anos acabados de fazer, tinha 27 e não me sentia perdida nem assustada como aos 25, mas sentia que já não me conhecia assim tão bem porque eu já não era mesmo eu.
Foi quando decidi tentar coisas diferentes, ler coisas diferentes, ver coisas diferentes, ir para o Tinder para conhecer pessoas diferentes. Não esperava, de todo, cinco meses depois me sentir ainda mais diferente. Mais do que isso, não esperava, cinco meses depois, perceber que estava num lugar instável e que tudo isto tinha sido um esforço para tentar chegar a algo estável. Só que, pelo caminho, houve várias coisas que deixaram de fazer sentido e outras que, entretanto, passaram a fazer todo o sentido.
Nos últimos três ou quatro meses comecei a notar que as mais pequenas coisas já não eram coisas minhas e comecei a sentir necessidade de mudar, literalmente. Um dia decidi cortar metade do cabelo e ficar com a minha cor natural (castanho muito escuro) durante uns tempos. Mas esta mudança não chegou. Só que a grande mudança que eu queria fazer não era simples e eu fui procurando desculpas para adiar. Até que finalmente me vi num caminho que levaria a essa mudança e agora dou por mim várias vezes por semana a procurar quartos na Maia.
Não é fácil explicar o que motiva este sentimento de querer estabilizar e de sentir que é necessária uma mudança grande. Pelo menos, eu não sei como explicar isto. O que sei é que este mês me permiti parar e avaliar os últimos meses e percebi que está na hora de deixar de lado as coisas com que já não me identifico e, principalmente, deixar os medos de lado e ir atrás da mudança.
Comecei pelas coisas simples: tirei 150 livros da minha lista por ler do Goodreads; separei 25 livros físicos para vender ou doar; eliminei séries e filmes que tinha no computador para ver há muito tempo, mas nunca tinha visto e agora já não me apetece ver; organizei a pasta de fotografias e outras pastas que tinha no computador; tirei algumas séries da lista para ver porque já não me apetece ver; fiz uma limpeza na lista de ideias para escrever no blog. Depois desta limpeza mais digital senti-me mesmo pronta para começar de novo noutro lugar. Como se estivesse a deixar para trás as bagagens que já não são necessárias.
Sei que muito do que mudou em mim aconteceu porque eu permiti uma pessoa entrar na minha vida e, com isso, permiti-me voltar a ser vulnerável, voltar a sentir várias coisas que não sentia há anos e até sentir várias coisas que nunca tinha sentido. Mas, mesmo com tudo o que isso mudou em mim, não sinto que as mudanças que ambiciono agora se devam a ele. Essas já por cá estavam, eu só as vejo com uma maior claridade agora.
Se falarmos de astrologia, há algo chamado Retorno de Saturno, algo que normalmente acontece por volta dos 27 ou 28 anos. Saturno é o planeta responsável pelas lições de vida que nos fazem ver o mundo de uma forma diferente. Quando, há uns anos, me fizeram uma análise detalhada do mapa astral li esta parte com um sentimento estranho. Se calhar os astros sabiam que isto ia acontecer. Há muita coisa que não sei neste momento, mas sei que está a ser interessante (que é como quem diz: desafiante) lidar com tudo isto que tem estado a acontecer.
Nesta fase em que me encontro tenho pensado muito naquilo que quero. Profissionalmente tenho estado em busca de algo que me preencha as medidas, mas também me permita ter algum tempo de qualidade fora do trabalho. Pessoalmente quero mudar de cidade e tentar voltar a incluir na rotina algumas coisas de que sinto falta. E tenho, claro, pensado muito nas minhas relações. Não tanto nas de amizade, mas nas outras. Se isto fosse um episódio de Friends provavelmente dir-te-ia que estamos on a break, o que justifica esta reflexão, mas é mais do que isso. Eu sei quem quero e como quero na minha vida, mas há coisas que não dependem de mim e este não é momento de tomar decisões.
Há uns meses, numa conversa com ele, disse-lhe que sentia que tinha passado de um Nokia 3310 para um iPhone 30. Embora o contexto fosse outro, às vezes ainda me sinto assim. Sinto-me num estado de actualização e melhoramento, sinto que tenho de tentar acompanhar-me porque há meio ano eu teria respondido de forma totalmente contrária a perguntas simples. O cerne é o mesmo, o que rodeia é que ainda está a adaptar-se. Agora, está a preparar-se. Vai tudo seguir o caminho que deve seguir.